Ao passar a noite em claro, velando D. Helena Mont’Alverne,
duas palavras insistentemente brotavam em meu pensamento, em meio às rezas
decoradas, aos salmos da Bíblia online, às imagens destes 42 anos em que
dividimos nossa vida, como sogra e nora, e avó de meus quatro filhos Lênio,
André, Oriana e Bruno: Pesar e Gratidão.
Pesar pelo momento em que a vida cessa e prova a
inexorabilidade do tempo. O tempo passa, escoa, se esvai e na maioria das vezes
não o percebemos, por isso inexorável. Quando nos deparamos com a concretude da
morte, pensamos que poderíamos ter feito mais, amado mais, sorrido mais, como
no Epitáfio dos Titãs. Poderíamos tirar um tempo de nosso tão corrido dia-a-dia
para olhar e amar um pouco mais aqueles que nos importam. Porque, diante da
morte de uma pessoa especial, o não se fez sempre se sobrepõe àquilo que
fizemos. Mesmo que tenhamos feito tudo o que pudemos. Eis o pesar.
Gratidão por ter compartilhado de quase metade da vida de D.
Helena. Uma vida plena, próspera de sentimentos e atitudes dignas e nobres. A
gratidão me faz recordar todos os carinhos, os acalantos, os conselhos, os
segredos que dividimos e permanecerão segredos por todo o sempre. Eu disse a
ela, ela me disse. Ponto. Isto é segredo.
Gratidão pelo afeto dispensado a cada membro de sua família,
onde me incluo. D. Helena foi para cada um de nós um guarda-chuva imenso que
nos abrigava a todos de qualquer intempérie.
Há muito tempo não passava uma noite em claro. Muito menos
revendo e avaliando momentos e situações diante de uma pessoa tão querida. E
agora inerte.
Inerte aos olhos físicos, pois no meu coração, na minha
mente, D. Helena estará no meu pensamento enquanto vida eu tiver.
Depois desse desabafo, sim, eu pude chorar. Um choro calmo,
extravasante, que mistura pesar e gratidão e me conforta, porque a imortalidade
de D. Helena está garantida pelas lembranças boas que todos os que conviveram
com ela se empenharão em guardar.