O Tempo de Fernando em Mim: 11 Meses de uma Safra
Permanente
Ao aprofundar em seus escritos literários ou acadêmicos e seu
vídeos particulares, relembro fatos que se apresentam como fio condutor do
pensamento que ele exprimia até a culminância do seu propósito para a primeira
leitura ou primeira publicação. Ele costumava falar comigo sobre seus projetos,
de suas visões desde a ideia inicial até a conclusão. Eu costumava dizer a ele
que eu era o seu “ouvido amigo”. Ele lia ou ouvia minhas expressões, às vezes
de concordância, outras nem tanto. Na maioria das vezes dizia: “preciso que
seja desta forma”, outras, “vou pensar melhor”. Eu só assentia.
Nesta jornada de imersão, deparo-me com textos inéditos até
para os meus ouvidos – e confesso um sorriso em meio às lágrimas. Estes, estou
organizando para novas publicações.
Estes tempos têm sido uma montanha-russa emocional. Meu
coração se apequena quando leio uma mensagem escrita para mim e não enviada e,
ao mesmo tempo, meu coração se avoluma de amor e carinho ao ver revelado diante
de mim tanto afeto e dedicação escritos em palavras que só descobri nestes
tempos de cumes e vales em que vivo hoje.
Nessa trajetória não há espaço para saudosismo e sim, creio
eu, uma busca ativa para a efetiva compreensão do meu 'tempo hoje', a partir do
'tempo de Fernando'.
Em “Oppidum tempo”, publicado no livro Canção do amor
enchente (2012), Fernando via o tempo como 'sombra que me
experimenta/irredutível'. Nele, percebo a crueza da separação, mas também a
força da inovação em lidar com essa inexorabilidade. O tempo que levou sua
presença física é o mesmo que me inova na busca por sua essência.
Em 'temPO CInzA' (2014), onde a paixão é uma 'inscrição no
granito' e o fogo 'jaz brando, oculto, mas vivo e bruto', vejo uma metáfora
perfeita para o que sinto. Minha espera não é passiva, mas uma paixão ativa que
se realimenta dos seus escritos, seus vídeos e seus rascunhos.
Nos versos de 'O tempo não conta para a eternidade' (também
de 2014): 'Lírico e lento / Lapida em cinzel de sonho', percebo como essa visão
de tempo, que transcende a cronologia, se manifesta em minha vida de agora.
Meus sonhos, minhas memórias e meu amor por ele não são finitos.
É nos versos de 'Safra Permanente', poema que dedicou a mim, que encontro a mais poderosa das chaves para entender essa presença. Ele escreveu:
Urge dizer a todos que te amo / e me alastrar, sôfrego, à tua procura diária / falar aos quatro cantos que o amor é necessário'.
Não há ausência capaz de calar um amor descrito como 'profuso, é disseminador'. E mais:
'O brilho desse amor estará preso ao laço que se ampliará conforme o tempo'.
Entendo que Fernando, com sua visão poética, já antecipava que nosso elo
nunca seria diminuído, mas sim ampliado e eternizado pela própria passagem do
tempo, transformando a dor da perda em uma colheita contínua de amor.
Percebo que meu papel de Guardiã inclui dar continuidade aos
escritos de Fernando, publicando seus textos, escrevendo sobre sua visão de
mundo, o que confere a ele uma nova forma de existência.
Sei e sinto que, se o tempo é implacável, o amor é ainda mais
potente, capaz de desafiar e redefinir a própria inexorabilidade.
E assim, enquanto o mundo mede os meses e os anos, eu
mergulho na eternidade de Fernando. O tempo, que a princípio pareceu tão cruel,
revela-se agora o cinzel que lapida a memória e o amor, transformando-os em uma
'safra permanente' em minha vida. Minha missão, como 'Guardiã dos seus
guardados', transcende a custódia. É a de ser a ponte, o eco, a nova voz que
permite que seus tempos estelares continuem a brilhar, eternamente em mim.
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