terça-feira, 5 de outubro de 2010

Simplesmente Ana Martel

Por Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4   

foto Márcia do Carmo Ela é Ana, Ana Martel, intérprete e compositora de temas cujos títulos lhe refletem a alma, “Simples Assim”. “Seu Lugar” é a Amazônia. Seu “Doce Cantar” voa e diz “Bom Dia, Maria”, a tantas Marias que povoam as terras macapaenses. A “Solução” pode estar no rio que dá água de beber ao “Pássaro Que Passou” fazendo uma sombra que se misturou à dela para alçarem voo juntos. Ana Martel tem olhar atento ao mundo, mas, de vez quando, fica “De Olhos Fechados”, para assim melhor enxergar. Assim é Ana, simples assim, Ana Martel.

Sou Ana – disco independente com patrocínio da Eletrobrás a partir do incentivo da Lei Rouanet – traz, além das sete músicas já mencionadas no parágrafo anterior, “Toque de Caixa”, parceria de Ana com Zé Miguel, e também “Sou Ana” (Sérgio Souto e Enrico di Miceli), “Branca no Samba” (Biratan Porto, Paulo Moura e Marcelo Sirotheau) e “Mal de Amor” (Joãozinho Gomes e Val Milhomem).

Ana é macapaense. Por seu canto e por seus versos se pode suspeitar que, ainda menina, ela foi à boca da brenha e gritou: “Prazer, sou Ana!”. A resposta não tardou: “Prazer, sou a floresta!”. Desde esse dia as duas se tornaram corda e caçamba, amigas inseparáveis, como se feitas uma para a outra.

Por seu frescor contemporâneo, a música de Ana Martel está impregnada de força amazônica. Sua voz tem a afinação dos passarinhos que cantam e voam sobre a copa das maiores árvores da floresta. Suas boas soluções melódicas vêm límpidas como o vento que abençoa enquanto esparrama benefícios.

A bateria tocada por Edvaldo Anaice encabeça as levadas, enquanto as percussões de Marcio Jardim e o poder dos tambores de marabaixo e de batuque, estimulados pelas mãos de Nena Silva, revelam a pujança rítmica de algumas das músicas de Eu sou Ana. A flauta tocada por Esdras de Souza tem destaque em ao menos cinco delas. O baixo de Príamo Brandão, ora elétrico, ora acústico, acentua a cozinha e dá peso às onze faixas do álbum. Os violões de náilon e de aço, bem como a guitarra de Davi Amorim, agregam riqueza melódica a pelo menos quatro canções.

Os arranjos foram divididos entre o bom pianista, tecladista e organista Jacinto Kahwage (seis) e o igualmente competente pianista, bandolinista, violinista e acordeonista Luiz Pardal (cinco). O resultado é uma agradável combinação de sonoridade e ritmo que propicia intensidade ainda maior aos versos e uma ampla visão da musicalidade amazônica.

Palmas para os compositores macapaenses, parceiros ou não de Ana Martel, eles que verbalizam o viver da gente do extremo norte do Brasil. Palmas para os instrumentistas que tocam seu belo trabalho à margem do que se escuta no restante do país. Palmas para Ana Martel, ela que trata de descrever e cantar a sua gente de Macapá, de Belém e de toda a Amazônia. Ana que parece entoar um colossal grito de “gracias a la vida” (ainda que nada tenha a ver com Mercedes Sosa), ao amor e em louvor à terra, à floresta e à música.

Foto: Márcia do Carmo

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Texto publicado na coluna deste final de semana no Diário do Comércio (SP), Meio Norte (Teresina), Jornal da Cidade (Poços de Caldas), A Gazeta (Cuiabá) e Brazilian Voice (uma publicação voltada para os brasileiros residentes em toda Costa Leste dos EUA).

Publicado no jornal “ Correio do Amapá de domingo, 03.10.10

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